
Homilia de Dom Henrique Soares da Costa – Assunção de Nossa Senhora
14/08/2020
Esta é a maior das festas da Santíssima Virgem Maria; é a sua
Assunção; a festa da sua entrada na glória, da sua plenitude como
criatura, como mulher, como mãe, como discípula de Cristo Jesus. Como um
rio, que após longa corrida deságua no mar, hoje, a Virgem Toda Santa
deságua na glória de Deus: transfigurada no Espírito Santo, derramado
pelo Cristo, ela está na glória do Pai!
Para
compreendermos o profundo sentido do que celebramos, tomemos as palavras
de São Paulo: "Cristo ressuscitou dos mortos como primícias dos que
morreram. Com efeito, por um homem veio a morte e é também por um homem
que vem a ressurreição dos mortos. Como em Adão todos morrem, em Cristo
todos reviverão. Porém, cada qual segundo uma ordem determinada". - Eis a
nossa fé, o centro da nossa esperança: Cristo ressuscitou dos mortos
como primícias dos que adormeceram. Ele é o primeiro a ressuscitar, ele é
a causa e o modelo da nossa ressurreição. Os que nele nascem pelo
batismo, os que nele crêem e nele vivem, ressuscitarão com ele e como
ele: logo após a morte ressuscitarão naquela dimensão imaterial que
temos, núcleo da nossa personalidade, a que chamamos "alma"; e, no final
dos tempos, quando todo o universo for glorificado, ressuscitaremos
também no nosso corpo. Assim, em todo o nosso ser, corpo e alma,
estaremos, um dia, revestidos da glória de Cristo, nosso Salvador,
estaremos plenamente conformados a Ele!
Ora, a Igreja crê,
desde os tempos antigos, que a Virgem Maria já entrou plenamente nessa
glória. Aquilo que todos nós só teremos em plenitude no final dos
tempos, a Santíssima Mãe de Deus, já recebeu logo após a sua morte. Ela é
a "Mulher vestida de sol, tendo a lua debaixo dos pés e sobre a cabeça
uma coroa de doze estrelas". Ela já está totalmente revestida da glória
do Cristo, Sol de justiça - e esta glória é o próprio Espírito Santo que
o Cristo Senhor nos dá. Ela já pisa a lua, símbolo das mudanças e
inconstâncias deste mundo que passa. Ela já está coroada com doze
estrelas, porque é a Filha de Sião, filha perfeita do antigo Israel e
Mãe do novo Israel, que é a Igreja. Assim, a Virgem, logo após a sua
morte - doce como uma dormição -, foi elevado ao céu, à glória do seu
Filho em todo o seu ser, corpo e alma. Aquela que esteve perfeitamente
unida ao Filho na cruz (cf. Lc 2,34s; Jo 19,25ss), agora está
perfeitamente unida a ele na glória. São Paulo não dissera, falando do
Cristo morto e ressuscitado? "Fiel é esta palavra: Se com ele morremos,
com ele viveremos. Se com ele sofremos, com ele reinaremos" (2Tm 2,12).
Eis! A Virgem que perfeitamente esteve unida ao seu Filho no caminho da
cruz, perfeitamente foi unida a ele na glória da ressurreição. Aquela
que sempre foi "plenamente agraciada" (Lc 1,28), de modo a não ter a
mancha do pecado, não permaneceu na morte, salário do pecado. Assim, o
que nós esperamos em plenitude para o fim dos tempos, a Virgem já
experimenta agora e plenitude. Como é grande a salvação que o Cristo nos
obteve! Como é grande a sua força salvífica ao realizar coisas tão
grandes na sua Mãe!
Mas, a Festa de hoje não é somente da
Virgem Maria. Primeiramente, ela glorifica o Cristo, Autor da nossa
salvação, pois em Maria aparece a vitória sobre a morte, que Jesus nos
conquistou. A liturgia hoje exclama: "Preservastes, ó Deus, da corrupção
da morte aquela que gerou de modo inefável vosso próprio Filho feito
homem, Autor de toda a vida". Este senhorio de Cristo aparece hoje
radiante na sua Mãe toda santa: em Maria, Cristo venceu a morte de
Maria! Em segundo lugar, a festa de hoje é também festa da Igreja, de
quem Maria é Mãe e figura. A liturgia canta: "Hoje, a Virgem Maria, Mãe
de Deus, foi elevada à glória do céu. Aurora e esplendor da Igreja
triunfante, ela é consolo e esperança para o vosso povo ainda em
caminho". Sim! A Mãe Igreja contempla a Mãe Maria e fica cheia de
esperança, pois um dia, estará totalmente glorificada como ela, a Mãe de
Jesus, já se encontra agora. Finalmente, a festa é de cada um de nós,
pois já vemos em Nossa Senhora aquilo que, pela graça de Cristo, o Pai
preparou para todos nós: que sejamos totalmente glorificados na glória
luminosa do Espírito do Filho morto e ressuscitado. Aquilo que a Virgem
já possui plenamente, nós possuiremos também: logo após a morte, na
nossa alma; no fim dos tempos, também no nosso corpo!
Estejamos
atentos! A festa hodierna recorda o nosso destino, a nossa dignidade e a
dignidade do nosso corpo. O mundo atual, por um lado exalta o corpo nas
academias, no culto da forma física, da moda e da beleza exterior; por
outro lado, entrega o corpo à sensualidade, à imoralidade, à droga, ao
álcool... É comum escutarmos que o que importa é o "espírito", que a
matéria, o corpo passa... Os cristãos não aceitam isso! Nosso corpo é
templo do Espírito Santo, nosso corpo ressuscitará, nosso corpo é
dimensão indispensável do nosso eu. Um documento recente da Igreja sobre
a relação homem-mulher, chamava-se atenção exatamente para essa
questão: o corpo em si, para o mundo, parece que não significa muita
coisa, que não tem uma linguagem própria, que não diz algo do que eu
sou, da minha identidade - inclusive sexual. Para nós, cristãos, o corpo
integra profundamente a personalidade de cada um: meu corpo será meu
por toda eternidade; meu corpo é parte de minha identidade por todo o
sempre! Honremos, então nosso corpo: "O corpo não é para a fornicação e,
sim, para o Senhor e o Senhor é para o corpo. Ora, Deus, que
ressuscitou o Senhor, ressuscitará também a nós - em nosso corpo- pelo
seu poder. Glorificai, portanto, a Deus em vosso corpo" (1Cor 6,14.20).
Então,
caríssimos, olhemos para o Céu, voltemos para lá o nosso coração!
Celebremos! Com a Virgem Maria, hoje vencedora da morte, com a Igreja,
que espera, um dia, triunfar totalmente como Maria Virgem, cantemos as
palavras da Filha de Sião, da Mãe da Igreja, pensando na nossa vitória:
"A minha alma engrandece o Senhor e o meu espírito se alegra em Deus,
meu Salvador, porque olhou para a humildade de sua serva. O
Todo-poderoso fez grandes coisas em meu favor!" A Ele a glória pelos
séculos dos séculos. Amém.
Dom Henrique Soares da Costa - Assunção de Nossa Senhora